Relatório do governador civil

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Relatório do governador civil

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Informação não tratada arquivisticamente.

Nível de descrição

Documento simples   Documento simples

Código de referência

PT/BPARJJG/ACD/GCHRT/00004/002

Tipo de título

Atribuído

Título

Relatório do governador civil

Datas de produção

1857-04-03  a  1857-04-03 

Dimensão e suporte

1 caderno, papel.

Âmbito e conteúdo

É o relatório de gerência do governador Luís Teixeira Sampaio Júnior. Trata-se do instrumento pelo qual ele apresenta ao ministro do Reino a sua visão do estado do distrito a respeito dos seguintes aspetos: a instrução primária, a instrução secundária, a instrução eclesiástica, os lazaretos, os cemitérios, os facultativos, a emigração, o recrutamento, as cadeias, as misericórdias, os asilos, as confrarias, a administração municipal, os expostos, a divisão de território. Possui junto o índice dos documentos que foram anexados ao relatório. --------------------------------------Transcrição de algumas partes do relatório:..........Instrução primária…..Já nos relatórios especiais que sobre a instrução pública tive a honra de remeter ao ministério a digno cargo de vossa excelência, tenho feito ver que a instrução primária no distrito se acha mais desenvolvida, e que, à proporção que se vão criando novas escolas, maior vai sendo a concorrência dos alunos. É portanto necessário e vantajoso que se vão estabelecendo novas escolas naquelas freguesias que ficam muito distantes das que funcionam, e por isso consigno aqui o meu pedido, já por várias vezes feito, e que a junta geral ampliou na sua consulta da sessão de 1856. No caso em que o pedido da junta não possa ser totalmente atendido, entendo que devem ser primeiramente contempladas as freguesias dos Cedros e Capelo no Faial, Prainha no Pico e Ponta Delgada nas Flores, em razão de serem bastante populosas e não poderem concorrer às escolas colocadas nas outras freguesias. Devo advertir que na freguesia dos Cedros existe um professor de primeiras letras com a gratificação de quarenta mil reis, paga pelo cofre das confrarias, e devo instar com a criação desta escola pelo governo, por causa dos motivos que serão expostos quando tratar da beneficência pública no distrito. Em todos os meus relatórios tenho declarado que o aproveitamento dos alunos não se achava em proporção com a sua concorrência, podendo atribuir-se estes resultados a diferentes causas, entre as quais suponho que mais avulta a pouca idoneidade da maior parte dos professores. Nem outra cousa se pode esperar de homens que ganham o diminuto ordenado de noventa mil reis, sujeito a décimas, e uma grande gratificação de vinte mil reis paga pelas câmaras municipais. Isto mesmo é bem reconhecido de todos, e todos os que realmente se empenham pela educação popular e pelo futuro desta terra lastimam sinceramente a mesquinhez com que é retribuído o ensino primário. Enquanto pois o Tesouro não se julgar habilitado para essa importante reforma nos ordenados dos professores das escolas de primeiras letras, devemo-nos contentar com o aumento que nestes últimos anos tem tido a existência das escolas primárias, e com os resultados favoráveis que dali têm provindo à educação popular. Ainda que já nos relatórios especiais tenha remetido os mapas de movimento dos alunos nas escolas, ajunto aqui o da instrução primária neste último ano, comparando com o ano de [espaço em branco], a fim de que se avalie melhor a diferença que se dá nestes últimos anos……….Cemitérios…..Felizmente no distrito acabou-se totalmente o antigo e prejudicial costume de se enterrarem os mortos nas igrejas. Em todo ele, tanto as câmaras municipais como as juntas de paróquia e algumas irmandades, com o consentimento do governo, têm cemitérios próprios, que tratam e sustentam. Mas como alguns destes tinham sido primeiramente muito mal colocados, foi forçoso obrigar as câmaras e as juntas a fazerem aquelas remoções que a saúde pública exigia. Assim o cemitério próprio dos ingleses, pela sua péssima colocação, foi mudado. O da junta de paróquia das Angústias, na cidade, foi extinto. As juntas de paróquia da Praia do Almoxarife e Castelo Branco estão construindo novos nos sítios indicados pelo delegado do conselho de Saúde, e se muitas outras intimadas para esse fim não deram já um inteiro cumprimento a estas ordens é pela razão de que não têm meios prontos para estas despesas. É de crer, porém, que havendo zelo e diligência da parte do governo civil, todas estas obras se concluirão em poucos anos, tendo-se assim satisfeito a uma obrigação legal recomendada pela higiene..........Emigração…..Na atualidade, em que a emigração tem chamado todas as atenções, é rigoroso dever da autoridade que trate de indagar as causas, e dizer quais são os efeitos desse facto social que tem sido e é objeto de tantas declamações e medidas administrativas. Uma coisa convém saber-se quando se fala da emigração deste distrito: a que se dirige para os Estados Unidos, ou que se embarca nas baleeiras que aqui vêm refrescar, é perfeitamente distinta daquela que vai para o Brasil. Duas circunstâncias caracterizam salientemente estes dois movimentos diversos da população: a primeira é que os emigrados do Brasil são, no seu maior número, solicitados por homens que especulam neste tráfico, enquanto que aqueles que se encaminham para os Estados Unidos, ou se matriculam nas baleeiras, vão levados pelo ganho da cobiça, ou fogem espavoridos ao para eles odiento serviço do exército; a segunda é que os colonos do Brasil vão dependentes dos carregadores que se pagam vendendo-lhes naquela região os seus serviços braçais, enquanto que o passageiro dos Estados Unidos, ou o baleeiro, vai livre desse jugo, e entrega-se logo a um trabalho, cujos frutos percebe e entesoura. Ou por virtude destas duas circunstâncias, ou outras perfeitamente estranhas, o facto é que estas duas emigrações têm consequências bem diferentes para a terra de onde partem à procura da fortuna ou à busca trabalho. O regresso dos que vão para os Estados Unidos [e] baleeiras, e em insignificantíssimo número para outros países, é consideravelmente maior. Este facto não só é observado pelos que vivem neste distrito, mas ainda é conhecido pelas estatísticas de movimento de entrada e saída dos passageiros e colonos neste distrito. Pela relação das pessoas que saíram para o Brasil do porto da Horta desde 26 de agosto até 31 de dezembro de 1856, isto é, durante toda a minha administração, vê-se que o número dos indivíduos, tanto naturais como de fora deste distrito, subiram a 2136, e que o regresso não excedeu a 225, isto é, de 2136 indivíduos, 1911 não voltaram à pátria, ou porque foram vítimas de moléstias e da miséria, ou porque se estabeleceram naquele império. Note-se uma coisa: esta saída de indivíduos em número de 2136 é desde abril de 1853, em que saiu o brigue São Domingos, primeiro navio relacionado no documento junto; de modo que esta emigração teve lugar durante o espaço de tempo de 4 anos. Note-se uma outra circunstância que vai fazer aumentar excessivamente o número dos emigrados para o Brasil. Enquanto se fez observar rigorosamente a portaria do ministério da Marinha, de 19 de agosto de 1842, que marca a tonelagem de 2 passageiros por cada 5 toneladas, a emigração clandestina era incalculável, como consta neste governo civil por suspeitas, testemunhas e às vezes correspondência oficial, tendo sido por este motivo instaurados os respetivos processos. Ora esta emigração clandestina deu-se com os dez primeiros navios da relação número [espaço em branco], sendo o patacho Margarida Leonor o primeiro navio que saiu deste porto, em dezembro de 1855, com aquele número de passageiros, que o capitão do porto, juntamente com peritos, entendia poder conduzir qualquer navio sem perigo na viagem e com todas as precauções indispensáveis para a sua comodidade e segurança. Já se vê, pois, que bem grande é a diferença que se observa na emigração legal em prazos de tempo tão desiguais; assim nos dez primeiros navios, desde abril de 1853, até dezembro de 1855, em que saiu a Margarida Leonor, foram 481 indivíduos, e desde dezembro de 1855, em que se preparou este último, até o último de dezembro de 1856, emigraram 1655, isto é, em 3 anos, saíram legalmente quase uma quarta parte daqueles que emigraram tão-somente num ano. É pois manifesto quanto não deve subir ainda o número real dos emigrados para o Brasil, e portanto quanto mais deplorável não é a proporção que existe entre aqueles que vão e os que não regressam. Analisamos agora os dados que temos do movimento de entrada e saída com os Estados Unidos e baleeiras. O mapa que podemos apresentar compreende um espaço mais curto de tempo, desde janeiro de 1854 a dezembro de 1856, isto é, durante o espaço de 3 anos, mas nem por isso poderemos deixar de concluir alguma coisa. Vê-se pois que o número de indivíduos saídos soma em 1070, enquanto o das entradas monta a 664, isto é, uma diferença de 406 para menos, no prazo de 3 anos. Ora cumpre observar neste lugar que esta emigração é propriamente das ilhas do Faial e Pico e dos outros distritos, pois que das Flores a emigração para as baleeiras, assim como para os Estados Unidos, é feita clandestinamente, não se podendo dizer que seja em pequena escala. Mas este movimento de saída não faz diferença para os cálculos que apresentamos, porquanto assim como vai sem que a administração a possa avaliar, do mesmo modo reflui sobre o solo da pátria, onde por fim vem estabelecer-se, e a proporção que se dá entre a entrada e saída daqueles indivíduos não deve distar muito do que apresenta no mapa junto. O que é, porém, mais certo é que esta emigração no Faial e no Pico não está muito longe da verdade, porquanto a emigração clandestina para estas partes é muito pequena, e mesmo insignificante, receando mesmo os carregadores levarem para os Estados Unidos um maior número de passageiros dos que lhe permite a tonelagem autorizada pelas leis daquele país. Ora comparando os resultados que nos oferece a estatística, com respeito a estas duas emigrações, temos que enquanto do Brasil não volta a nossa parte, dos Estados Unidos regressa muito mais da metade, e se quisesse ainda acrescentar a estes dados os duvidosos e incertos, mas que se supõem próximos à verdade, da emigração clandestina, poderia afiançar que nem a duodécima parte dos indivíduos que vão para o Brasil regressam ao seu terreno natal, enquanto dos Estados Unidos, pelo menos, vem a metade. Ora este facto da volta poderia ser um aumento contra a emigração para os Estados Unidos e baleeiras, se porventura se provasse que a falta trabalho e a miséria os tinha chamado ao seio da sua família, mas não. O rapaz, que muitas vezes ainda imberbe, se ausenta do campo paterno, que ajuda a lavrar, traz sempre um capital, fruto do seu trabalho e da sua economia, às vezes de longos anos, e logo que chega a pisar a terra do seu nascimento e dos seus pais, compra ou constrói imediatamente uma casa, quer uma terra para cultivar e muitas vezes deixa tudo isso que comprou à família que nunca esquece para correr atrás da fortuna e passar a vida de aventureiro a que se tem acostumado desde criança. Esta comunicação contínua com os Estados Unidos, que são para o povo do distrito mais conhecidos do que a metrópole, não só tem feito abundar estas ilhas de numerário, mas ainda tem derramado, entre as classes menos abastadas, certos hábitos de confortable e de bem-estar social, muito desconhecidos ao nosso povo do continente. Assim, pois, se os Estados Unidos absorvem metade da população que os busca para o trabalho, por outro lado compensam de certa maneira, talvez vantajosa para o distrito, a perda que sofre com a diminuição de braços úteis ao trabalho. Compensam não só em capitais e indústria, mas ainda em ideias e ilustração, que hão de ser uma das coisas mais poderosas para a mudança dos hábitos antigos e progressivo melhoramento do distrito. O Brasil, porém, enquanto que nos absorve um número de braços demasiado considerável e superior às necessidades que temos deles, manda-nos um dia ou outro uma fortuna mais elevada, mas a maior parte vem sem meios, e pobre como foi. Estes factos são de todos os dias, vê-os quem os quer ver e devemos dizer a verdade. Se a emigração do Brasil continuar na escala que se deu no ano de 1856, se os aliciadores com o auxílio da moléstia das vinhas iludirem estes desgraçados, os braços hão de faltar e a agricultura há de senti-lo. É pesar que tudo quanto sejam trabalhos estatísticos se faça descuidada e negligentemente, pois que se os factos se comprovassem de uma maneira incontestável, as causas seriam avaliadas mais exatamente, e o administrador, esforçando-se por lhe achar a razão, encontraria afinal aquelas medidas que cortassem o mal pela raiz. Mas que se pode julgar e fazer? Se se tentar conhecer quais são os resultados da emigração com respeito à população permanente do distrito, se esta se conserva estacionária, se aumenta ou se diminui, se os meios de subsistência estão em proporção com a população, se tanto aqueles como esta podem aumentar e crescer, se tão longe se quiser ir por diante, os dados estatísticos colhidos e havidos como são em Portugal são insuficientes e impotentes para responder a tão intrincada e difícil questão. No entanto, se se compulsarem assim mesmo os dados que existem, ver-se-á que, no espaço de 6 anos, a população no ano de 1855 encontra uma cifra de 2388 indivíduos menos que no ano de 1850. Parece-me, porém, que esta cifra no ano de 1850, que eleva a população a 68399, não será muito exata se olharmos a que nos 5 anos seguintes, assim como no ano anterior de 1849, pouco excedeu a 66000, conservando-se durante este tempo pouco mais ou menos sem grandes diferenças de uns anos para os outros. A consequência, pois, mais exata que se pode auferir destes dados é que se a população não diminui, conserva-se pelo menos estacionária. O que se nota com o número dos indivíduos não se dá com o número de fogos. Estes, nos anos apontados, vão seguindo, ainda que lentamente, uma escala progressiva, o que facilmente se explica pelas consequências da emigração para os Estados Unidos. Mas pergunta-se: a população sobrepuja e a terra não poderia produzir mais? Sobre este ponto parece-me que não pode haver dúvidas. Ainda existe muito terreno inculto nas ilhas do Pico e Flores, onde a agricultura poderia fazer grandes progressos e fundar povoações. O método da cultura é atrasado, e faz perder muito tempo e muito terreno; e tudo isto, se fosse tratado seriamente, se houvesse homens diligentes e poderosos que aplicassem os seus capitais a estas empresas de grande utilidade futura, acredito que população poderia dobrar sem se conhecer excesso e falta de subsistência. Ora que esta não adianta muito infere-se concludentemente do mapa da produção dos cereais que se junta. Só o inhame é que tem tomado um maior desenvolvimento devido à doença das batatas, doença que do mesmo mapa se vê caminhar numa rápida declinação, e a Deus praza que totalmente se extinga, pois que é esta uma das causas que tem concorrido para se elevar o preço dos cereais. Ora infelizmente nenhuma outra cultura se tem desenvolvido no distrito que compensasse a falta das laranjeiras, já de tantos anos, e que presentemente se dá nas vinhas. Não é este o lugar de tratar objetos da agricultura; quando penso em assinar as causas e consequências da emigração, as quais, em resumo e em poucas palavras, são as seguintes. A emigração dos Estados Unidos vai livre, é um gozo do direito do homem, o desejo do ganho e fuga ao recrutamento. Esta emigração não desfalca a população, importa capitais de grande monta e traz hábitos de confortable e ideias de civilização. A do Brasil, porém, vai aliciada e escrava. Desfalca a população com prejuízo da terra. Os que voltam, poucos. Destes, poucos ricos e maior parte miseráveis. Eis senão um engano, o verdadeiro juízo que se deve fazer sobre este importante objeto. A consequência, portanto, do que deixo dito é que o governo de Sua Majestade deve pesar todos estes factos, e fazer esforço para que os Açores não se vão despovoando, criando novas fontes de trabalho, onde vão procurar os meios de fortuna. E digo isto porque julgo que os meios repressivos são insuficientes e impotentes para se alcançarem os fins que desejam. A lei de 20 de julho de 1855, que foi feita com as louváveis tenções de reprimir a emigração clandestina, ainda hoje difícil de execução porque grande parte das suas disposições precisa dum amplo desenvolvimento dos regulamentos do executivo, não terá aqueles resultados que se acreditam em um país onde quase todos pensam de uma maneira bem diferente às suas determinações. E de que serve uma lei sem o consenso público? Assim, pois, o melhor meio de inutilizar os efeitos perniciosos da emigração seria a abertura de grandes obras e o cometimento de empresas agrícolas e industriais. Felizmente para os povos, o governo de Sua Majestade tem uma grande obra de que lançar mão, a feitura da doca, cujo projeto vai no lugar competente……….Cadeias…..Já por várias vezes se tem representado sobre o péssimo estado em que existia a cadeia desta cidade. Pode-se e deve-se antes dizer que a não há, tais são as ruínas deste edifício. É esta uma obra das mais indispensáveis e urgentes nesta cidade, e, por isso, novamente represento sobre esta grande necessidade, e devo solicitar de vossa excelência que se digne olhar por este objeto……….Asilos…..No distrito não existe senão o asilo de mendicidade que se acha estabelecido no hospital da Santa Casa da Misericórdia da Horta. Infelizmente, esta filantrópica instituição não tem podido criar raízes e os meios com que até hoje se tem sustentado podem falhar um dia. Ainda que durante a minha administração tenha recebido donativos de alguma importância, não foram estes, contudo, de tal ordem que o pudessem colocar no convento de Santo António, que lhe foi doado pelo governo de Sua Majestade, estabelecido sobre aquele pé em que mais pudesse prosperar. Vivendo até hoje à sombra da Santa Casa, dirigida, ou pela própria mesa da irmandade, ou por direções estranhas a esta, a sua administração tem-se ressentido destas mudanças e do pouco zelo que se tem aplicado à sua conservação. É mister, pois, fazer um esforço para a prosperidade deste estabelecimento e, primeiro que tudo, convém-lhe dar uma direção perfeitamente sua, independente e enérgica, ou como aquela que tive a honra de propor em meu ofício de 2 de dezembro de 1856, ou outra qualquer, com tanto que seja permanente, dedicada e zelosa. Não obstante as dificuldades que reconheço ter encontrado, o asilo de mendicidade para se conservar, tentei a instalação de um asilo de infância desvalida, que, no meu modo de entender, será mais útil e benéfico do que o primeiro. Para isso me dirigi a todas as pessoas respeitáveis do distrito e mesmo fora dele, pedindo-lhes o seu consenso e apoio, e pude conseguir uma soma suficiente para os primeiros preparativos, como já declarei ao ministério a digno cargo de vossa excelência em meu ofício de 28 de outubro de 1855. A sua instalação, porém, como dependia da concessão, já pedida por vezes, do convento de Santo António, que por enquanto usufrui o asilo de mendicidade, não tem sido possível até hoje. Dir-se-á, porém, que tendo sido difícil a conservação de um asilo, muito mais será de dois. No entretanto as minhas ideias sobre este ponto talvez sejam bem baseadas, e se porventura fossem realizadas com diligência e empenho, acredito que não seria uma tentativa baldada. Examinemos as coisas. O asilo de mendicidade continuaria no hospital da Santa Casa. O asilo de infância seria colocado no convento e cerca de Santo António. Ora o convento precisava de um conserto de grande custo, com que nunca pôde o asilo de mendicidade, mas que poderia empreender o da infância pelos donativos que se obtiveram. A questão, portanto, está na sua conservação. Mas o asilo de infância no princípio poderia admitir tão-somente 12 a 18 crianças. Trezentos mil [reis] seriam suficientes para este número. Os meios que lhes aplicava para o seu pagamento são os seguintes: 1.º retirar da aplicação das sobras das confrarias ao asilo de mendicidade a quantia de 100$000 reis. Mais adiante mostrarei como tencionava preencher o desfalque, tanto desta quantia como do rendimento da cerca; 2.º fazer contribuir o cofre dos expostos com 150$000 reis anuais. Ora a razão desta contribuição sobre aquele cofre é bem óbvia e clara. Toda a gente em Portugal sabe que o exposto, chegando à idade de 7 anos, é entregue ao juiz dos órfãos para o assoldadar, mas quantos desgraçados não há que ninguém quer receber? Qual é a consequência deste facto? De duas, uma: ou a criança é desamparada ou tem de ser entregue à mesma ama com alguma gratificação paga pela câmara, como acontece no distrito. Esta despesa, pois, inevitável e que saía do cofre dos expostos, seja aplicada para o asilo de infância, com a obrigação de acolher aqueles desgraçados que não possam obter outro abrigo. E se uma boa estrela fadar este estabelecimento, não poderá ele, de certo modo, resolver a mais espinhosa questão na administração dos expostos? A sua sustentação e educação depois dos 7 anos da criação? Pode ser, e toda e qualquer tentativa neste sentido merece algum benefício e, máxime, quando é tão pequeno. Para preencher, pois, a nossa quantia, falta-nos tão-somente a quantia de 50$000 reis. Será esta soma de tanta consideração que a caridade pública não a satisfaça? O desamparo, a pobreza e o infortúnio destes tão infelizes não poderão alcançar, com os seus cantos e orações inocentes, o abalo da caridade? Ninguém por certo se atreverá a dizer que não. Ora a estes meios devemos acrescentar tanto os géneros, que se retirarão da cerca, como as mensalidades das irmandades, que pretendo erigir para esse fim. Com estes meios já se vê que o asilo não poderá receber menos de 400$000 reis anuais, porque não é crível, nem deve imaginar-se sequer, que a caridade pública contribua tão-somente com 50$000 reis. Ora vejamos agora como os rendimentos do asilo de mendicidade hão de ser substituídos. Temos os 100$000 reis das confrarias, que com os 30$000 reis da cerca, porque se acha arrendada, perfazem a quantia de 130$000 reis. Ora, primeiro que tudo, devemos advertir que as confrarias da Horta, como se vê no mapa respetivo, a este relatório junto, número [espaço em branco], têm contribuído não só com [espaço em branco] para o asilo de mendicidade, mas ainda com 90$000 reis para duas escolas, uma nos Cedros e outra na cidade. A da cidade foi ultimamente criada pelo governo de Sua Majestade, em virtude das requisições feitas tanto pela junta geral como por mim, obtendo-se, por isso, uma economia de 50$000 reis a favor das confrarias, e se a escola dos Cedros, que tem sido solicitada ao governo de Sua Majestade, já por várias vezes, for definitivamente criada e paga pelo governo, teremos uma economia de mais 40$000 reis que, juntos aos outros 50$000, veem a importar 90$000. Já se vê, portanto, que não nos falta senão 40$000 reis, que podem muito bem pagar as sobras do rendimento das confrarias do Pico, visto que grande parte dos asilados são naturais daquela ilha. Assim, depois de se obterem estes benefícios, devo solicitar novamente do ministério a digno cargo de vossa excelência: 1.º que seja concedido o convento e cerca de Santo António ao asilo de infância desvalida; 2.º que seja criada uma escola de primeiras letras na freguesia dos Cedros, como já tem sido solicitado em várias consultas da junta geral; 3.º, e finalmente, que o projeto para a organização do asilo de mendicidade seja definitivamente aprovado, tal qual foi proposto, ou com aquelas modificações que se julgarem indispensáveis. Ora se todos estes estabelecimentos forem montados e dirigidos com verdadeiro empenho, capacito-me de que uma bem entendida caridade há de lhes dar recursos e forças para a sua prosperidade e engrandecimento……….Expostos…..No ministério a digno cargo de vossa excelência existem vários documentos sobre esta administração, nos quais se vê, evidentemente, o que era, o que é hoje e os desejos que animarão tanto à junta geral como a este governo civil, para empreenderem a reforma de que se carecia. Um simples e único documento em que já falei, mas que junto por cópia, denuncia, evidentemente, qual era o cuidado e fiscalização que se dava neste importante ramo do serviço público. A leitura deste documento é realmente curiosa e não deixa de ter a sua originalidade chistosa, se não fora em tão sério e desgraçado assunto, o dizer o escrivão de uma câmara que não sabe quais eram as amas a que foram entregues duas ou três expostos. A esta imprevidência e negligência, quase culpável, com que se entregavam estas crianças, filhas da desgraça, acrescia a fiscalização, que era nenhuma! Não havia um sinal por onde se reconhecesse o exposto, não havia uma pessoa que vigiasse nos abusos que se cometiam nesta administração, e a única coisa que se ouvia sobre esta matéria eram os brados e lamentos das municipalidades sobre o aumento da despesa, que lhes absorvia todos os fundos e os impossibilitava de pensarem em qualquer coisa para que fosse necessário despender dinheiro. Em parte as municipalidades têm razão, porque as despesas com os expostos há muitos anos têm consumido grandes rendimentos, mas por outro lado também deve-se dizer, porque é verdade, pouco se tem cuidado nos meios, já de fazer diminuir a exposição, e portanto a despesa, já mesmo em vigiar pela vida destes desgraçados, como a humanidade e religião clama e exige. Ora a junta geral, nem tão pouco temos a louca vaidade de acreditar que fizemos tudo, mas podemos afoutamente dizer que pensámos, falámos e principiámos a obra, que a outra caberá concluir sobre melhores bases e com mais precisão de dados. No entretanto, a adoção do regulamento tem já produzido alguns resultados práticos, cuja utilidade e conveniência será mais tarde devidamente apreciado. Primeiro que tudo, já não pode uma criança ser entregue a qualquer ama, sem que esta se conheça, sem que se tirem informações sobre o seu procedimento e estado de saúde. Se, desgraçadamente, algumas câmaras ainda não olham para esta entrega como devem, se não se esforçam em vencer as dificuldades que se apresentam, principalmente na Horta, com a falta de amas, virá tempo em que os vereadores e pessoas a quem especialmente é confiada a administração em detalhe terão o cuidado que deve haver na entrega destes desgraçados a mulheres que, ou não as contaminem com o seu mau leite, ou não os degradem moralmente com os seus péssimos costumes. Logo que a criança é dada a uma ama, esta fica sujeita às visitas domiciliárias que o regedor é obrigado a fazer, de três em três meses, um vereador pela câmara nomeado, dentro no ano, e por todos aqueles delegados, que o governador civil entender conveniente em certas épocas. O resultado destas visitas ainda se não pode avaliar devidamente, porque nem aqueles que são chamados pelas leis e pelos regulamentos a exercerem funções especiais são tão solícitos e cuidadosos dos deveres que lhe são impostos, como a regularidade e o bom andamento do serviço reclamam. Mas quem pode duvidar de que estas visitas domiciliárias poderiam obter o ótimo resultado, já de se conhecer a paternidade destes desgraçados, e obter-se por este modo o benéfico efeito de lhes dar uma família, já de se saber do estado sanitário destes infelizes, nos quais a morte se compraz em fazer o maior número das suas vítimas? Por esse mesmo regulamento suscitou-se a observância da ordem do livro número 1, título [espaço em branco], assim como do alvará de 18 de outubro de 1806, § 8, a fim de que se evitassem os abusos bem sabidos de se lançarem na roda crianças cujos pais eram geralmente conhecidos. O princípio de se darem subsídios às mães solteiras, que por muito pobres não podiam criar os seus filhos, foi adotado pela junta, e ainda que tenha tido por enquanto um grande desenvolvimento, é de crer que no futuro produza benéficos resultados, iguais aos que são colhidos nos distritos do reino e em França. Um grande benefício, porém, já se realizou no concelho da Horta: as pobres amas recebiam por 4 anos a quantia anual de 8$000 reis, e no fim deste tempo uma propina de 4$000 reis. A consequência era a ama continuar a ficar com o exposto, sem nenhum vencimento numa idade basta tenra, impotente para lhe prestar qualquer serviço, visto que o juiz dos órfãos se via na impossibilidade de o poder assoldadar. A criação, pois, do exposto foi sobre minha proposta elevada a 7 anos, com uma gratificação, é verdade, assaz diminuta, nos últimos 3 anos, mas que a junta teve receio de aumentar por causa do acréscimo inevitável da despesa. Na Madalena, onde a criação era de 6 anos, também foi elevada a 7, observando-se assim em todo o distrito a mesma regra, que é efetivamente aquela que se conforma com a nossa legislação vigente. Na sessão da junta geral do último ano atendeu-se a uma circunstância que muitas vezes se repete. O exposto, muitas vezes depois de findo o tempo da criação, é tão enfezado e mesquinho, que ninguém o recebe por termo. Não havendo ainda neste distrito um asilo de infância onde possam ser recolhidos, era evidente que se carecia de alguma providência que legalizasse a despesa que, ordinariamente, fazem as câmaras com estes desgraçados. Para esse fim foi aprovado pela junta geral, nos termos do documento número [espaço em branco], a proposta que lhe fizera. Do que deixo dito vê-se, pois, que o governo civil tem seriamente pensado em dar uma direção a uma norma regular a este delicado ramo da administração, em que a humanidade é também interessada, e se por ventura não tem conseguido tudo quanto desejava, é também uma verdade documentada e vista no concelho da Horta, que é onde mais abunda o número dos expostos, que no primeiro semestre do ano económico de 1856-1857, diminuíra tanto a exposição como a despesa. Agora o que resta saber é se a escala descendente progredirá por efeito das disposições regulamentares, ou se esta é temporária e devida tão-somente a causas extraordinárias, alheias às medidas de administrador. O tempo resolverá este problema. A esta parte do relatório, e para conhecimento especial desta matéria, junto os mapas que já foram dirigidos a vossa excelência, em ofício sob número 110, de 9 de dezembro de 1856……….Divisão do território…..Já por várias vezes tem sido reclamado tanto pela junta geral como por este governador civil a criação de uma paróquia na Fajã Grande, que forma parte da Fajãzinha, concelho das Lajes, ilha das Flores. A conveniência e necessidade desta medida são reconhecidas imediatamente por quem visita aquela ilha. A Fajã Grande, onde há uma ermida com espaço mais que suficiente para ser constituída em paróquia, é separada da Fajãzinha, da qual dista uma légua, por uma caudalosa ribeira, que no inverno corta completamente as comunicações. É este um embaraço bastante grande para a administração dos sacramentos, e de todos os ofícios divinos, pois que muitas e muitas vezes nem o pároco, nem o povo podem vencer esse obstáculo. Além disso a Fajã Grande, nestes últimos anos, tem aumentado em virtude das comunicações com baleeiras, e América, e vai tomando o aspeto de uma pequena vila, como não oferece a povoação da Fajãzinha onde se acha assente a igreja paroquial, que é uma das melhores da ilha. Não pareça que pela divisão da freguesia em duas, fique cada uma destas com um pequeno número de fogos. A freguesia tem o número total de fogos 469 e almas 2718, ora as pequenas povoações, que juntas podem formar uma freguesia especial, terão cada uma pouco mais ou menos a metade dos fogos já ditos. Consta-me que, no ministério da Justiça, existe algum requerimento dos moradores da povoação da Fajã Grande, solicitando já esta divisão, e a junta geral na sua consulta do ano passado explanou-se sobre este objeto, do qual se podem colher as convenientes informações a este respeito. É este um grande serviço feito àqueles povos, que todos os dias o reclamam com instância.

Condições de acesso

Comunicável.

Cota atual

C0.

Idioma e escrita

Português.

Características físicas e requisitos técnicos

Estado de conservação: bom.

Data de publicação

23/11/2016 15:01:07